A Lei 11.101/2005, que regula a recuperação judicial, a falência do empresário e da sociedade empresarial, dispõe, em seu art. 49, § 3º, que não se submetem aos efeitos da recuperação judicial os créditos garantidos por alienação fiduciária.

Na hipótese de ser constatado que o bem alienado fiduciariamente é essencial ao bom funcionamento das atividades da recuperanda, este poderá ficar em posse da mesma, no lapso temporal autorizado por lei, 180 dias (art. 6º, § 4º).

Assim, para que se evite o exercício disfuncional e irregular do direito, deve ser analisada de forma criteriosa a essencialidade do bem à continuidade da atividade empresarial, cuja atribuição fica a cargo do Juízo da recuperação judicial, que tem acesso a todas as informações sobre a real situação do patrimônio da recuperanda, o que tem o condão de impedir a retirada de bens essenciais, conforme entendimento consolidado do e. Superior Tribunal de Justiça.

Temos, então, que, não obstante a proteção legal, em homenagem ao princípio da preservação da empresa contemplado no art. 47 do diploma falimentar, várias decisões judiciais têm autorizado a permanência dos bem alienados fiduciariamente na posse da recuperanda, após o decurso do prazo fixado em lei, o chamado stay period e, até mesmo até final cumprimento do plano de recuperação judicial.

Se por um lado o legislador procurou proteger a empresa em recuperação judicial, propiciando a continuidade de suas atividades mediante a permanência dos bens alienados fiduciariamente em sua posse pelo período legal, de outro lado, há de se prestigiar a segurança das relações contratuais e o legítimo direito do credor fiduciário de reaver os bens que lhe pertencem e é aqui que a questão toma contornos controvertidos.

A proteção dispensada à empresa em recuperação judicial, deixando-a usufruir dos bens alienados fiduciariamente, desautorizando o credor de apreendê-los, causa incertezas e prejuízos aos credores, podendo acarretar enriquecimento sem causa a recuperanda e, até mesmo, pode colocar em dúvida a própria viabilidade do cumprimento do plano de recuperação judicial.

E isto porque fica evidenciada a impossibilidade de soerguimento da recuperanda, haja vista que esta depende do patrimônio alheio para superar a situação de crise, prejudicando, até mesmo, quem possui crédito extraconcursal.

Vale aqui, a reflexão de Paulo Penalva Santos: “…Decorridos seis meses (aproximadamente são cento e oitenta dias) da data do processamento do pedido de recuperação, as execuções dos credores são permitidas a favor dos credores não sujeitos e, no caso concessão da recuperação, de todos os demais, não se distinguindo entre os bens os que são, ou não, indispensáveis a manutenção da atividade empresarial. Nesse aspecto, a Lei n. 11.101/2005 mostra-se ineficiente por não prever mecanismos de coordenação dos direitos dos credores, como, por exemplo, conceder maior flexibilidade para o magistrado conduzir o processo, ampliando ou reduzindo os prazos de suspensão” (10 anos de vigência da lei de recuperação e falência lei nº 11.101/2005, 1º edição, Saraiva, 2015).

Por tais motivos, é de essencial importância a análise cautelosa do juízo falimentar, a fim de identificar eventuais condutas de má-fé daqueles que buscam, tão somente, obstar a busca e apreensão dos bens, daqueles que comprovam a necessidade da prorrogação com a finalidade de preservar a manutenção da empresa como fonte produtiva, nos termos do artigo 47 da Lei nº 11.101/2005, possibilitando, assim, a dilatação do stay period por prazo superior ao previsto em lei.